BREVE HISTÓRIA

Nesse já distante ano de 1958, o Inverno não o foi estação fria para a cultura vimaranense. No Janeiro em que tantas plantas se casam com a terra-mãe, quis o amor pelo cinema que não havia – ou raras vezes se encontrava – em Guimarães, que se lançasse nesta terra úbere a semente que um dia floriu ante aos olhos de Lumière.
Facto que não deixa de ser curioso, é o de escrever estas notas quando se comemora o centenário da mágica arte do cinema.
Uma das formas de contornar a dificuldade de poder ver bom cinema era a criação de um Cineclube, experiência que tinha vivido em Coimbra e que tinha no Porto a expressão paradigmática.
Joaquim Santos Simões (fundador do Cineclube de Guimarães)
In “Cineclube de Guimarães – História Breve”
 

Fundado em 17 de Maio de 1958, o Cineclube de Guimarães veio corresponder a uma necessidade objectiva em termos de cultura cinematográfica da cidade de Guimarães e no seu concelho. Em pleno regime fascista do Estado Novo, como outras associações culturais, o Cineclube de Guimarães confrontou-se com as dificuldades inerentes às associações não-alinhadas pelos critérios políticos e culturais de então. A batalha pela aprovação dos Estatutos foi a primeira demonstração de unidade e determinação desta instituição, só se concretizando em 1959. A aceitação por parte do Secretariado Nacional de Informação (SNI) das listas democraticamente eleitas para os órgãos sociais foi outro momento de grande e decidida mobilização.

A actividade regular iniciou-se em 1958 com a projecção de filmes em 35mm no Teatro Jordão. Paralelamente, foram-se realizando diversas sessões dedicadas ao público infantil e abertas à comunidade. Também o jazz, expressão musical muito marginalizada na época, teve lugar no espaço do Cineclube com a realização de audições seguidas de debates. É durante a década de 60 que o Cineclube de Guimarães alarga e consolida a sua implantação na sociedade vimaranense, fruto de trabalho continuado e persistente. Esta aceitação explica-se pela criteriosa programação, em contraste com a grande maioria dos filmes exibidos comercialmente na única sala então existente.

A partir de 1971, o Cineclube de Guimarães muda de sala de exibição, passando a realizar as suas sessões no recém-inaugurado Cinema São Mamede, oferecendo aos seus associados melhores condições de conforto e de projecção cinematográfica. Após o 25 de Abril de 1974, o Cineclube de Guimarães experimenta um período de grande crescimento, o qual dá origem a uma maior diversidade sociológica na sua composição associativa. Nesta fase, a instituição alarga e aumenta substancialmente a sua actividade, especialmente a que respeita a itinerância por Escolas, Sindicatos, Estabelecimento Prisional, Associações Recreativas e Desportivas de todo o concelho. 

A década de 80 foi particularmente impiedosa para o Cinema em Portugal, assistindo-se ao encerramento das grandes salas de cinema do país, tendo o movimento cineclubista resistido à investida dos videoclubes, da televisão estrangeira e da mudança de hábitos dos portugueses. O Cineclube de Guimarães conseguiu resistir à grande crise que o cinema atravessou, e foi capaz de diversificar a actividade, alargando-a à música popular e tradicional, preenchendo o enorme e histórico vazio nesta área. É assim que organiza espectáculos, entre outros, com Carlos Paredes, Nortada, La Musgaña, Júlio Pereira, Gwendal, Emilio Cao e os Encontros Musicais da Tradição Europeia, com a presença de oito grupos. 

Em 1980, em colaboração com a Biblioteca Gulbenkian local e a Câmara Municipal de Guimarães, e com apoio do Instituto de Tecnologia Educativa, o Cineclube dinamizou a produção do filme “Rio de Couros” (em 16mm), que abordava a tradição da indústria de curtumes e questões históricas, sociais e económicas associadas. Em 1989, o Cineclube apresenta a primeira edição do Cinema em Noites de Verão, um ciclo de cinema ao ar livre, no Centro Histórico, conseguindo rapidamente tornar-se numa iniciativa do agrado de vimaranenses e dos inúmeros visitantes nacionais e estrangeiros. 

Em 1994, a Assembleia Municipal de Guimarães, sob proposta da Câmara Municipal de Guimarães, atribui a Medalha de Ouro de Mérito Cultural ao Cineclube, a máxima distinção atribuída por uma autarquia. Em 1995, o Cineclube de Guimarães organizou e acolheu o XII Encontro Nacional de Cineclubes, em colaboração com a Federação Portuguesa de Cineclubes. Em 1996, integrado nas comemorações do centenário do cinema português, foi editado o livro “Cineclube de Guimarães – História Breve”, da autoria de Joaquim Santos Simões.

Entre 1996 e 2005, o Cineclube de Guimarães passou a organizar as suas sessões regulares no Auditório da Universidade do Minho, um espaço com capacidade para cerca de 500 espectadores. Em 2000, integrado no Festival do Milénio, o Cineclube organizou o Ciclo “O Século dos Filmes” em colaboração com a Cinemateca Portuguesa e com o apoio da Câmara Municipal de GuimarãesEm 2005, com a inauguração do Centro Cultural Vila Flor, o Cineclube de Guimarães foi convidado a realizar as suas sessões neste novo espaço, sessões que passam a integrar a programação desse importante centro cultural e artístico. Esta distinção faz do Cineclube de Guimarães a única instituição residente e que maior actividade aí desenvolve, excluindo obviamente a actividade própria do Centro Cultural. A possibilidade que o Cineclube de Guimarães passou a ter de utilizar os dois Auditórios do Centro Cultural Vila Flor, permite-lhe organizar regularmente no Pequeno Auditório (200 lugares) os Ciclos de Cinema, paralelos aos 6 filmes mensais no Grande Auditório (800 lugares). Assim, desde 2006, organiza três ciclos por ano, com os mais diversos temas.

Em 2002, o Cineclube de Guimarães criou a sua Secção de Fotografia (em tempos partilhada com outra associação) com organização de cursos de formação (abertos a toda a comunidade) e exposições. De salientar que estas acções têm sido frequentadas por pessoas de diversas gerações e têm-se vindo a repetir anualmente. Em 2007, o Cineclube de Guimarães, através da sua Secção de Fotografia, editou o livro “Vimaranenses”, 1º livro da série de 6 livros de fotografia, intitulada “Cadernos de Imagens”. Em 2010 é editado o 2º livro, intitulado “Vimaranenses – As mãos e as máquinas”, em simultâneo com a exposição dos trabalhos aí publicados. Ao longo da sua história o Cineclube organizou sessões de cinema com banda sonora interpretada ao vivo, sendo os exemplos mais recentes, ”Comboio de Sombras” pelos Oddawn, “Aurora” pela orquestra Láudano e o filme “Frankenstein”, orquestrado ao vivo pelos KungFuTrunx. A partir de 2016, o Cineclube tem organizado o espetáculo As Canções e os Filmes, uma celebração do cruzamento do cinema com a música, dedicado não às canções em geral, mas à sua expressão pop, a qual, a partir da década de 1950, vem acompanhando inúmeros filmes e cuja importância na estrutura narrativa é inquestionável.

Em 2011 foi criada a Secção de Imagem e Movimento do Cineclube de Guimarães, que organizou um Workshop de Cinema DSLR. Também nesse ano, o Cineclube foi convidado a associar-se às comemorações da Elevação de Guimarães a Património Mundial da Humanidade, com a organização de uma exposição de fotografia e exibição de imagens em movimento “Outras Visões”, da responsabilidade da Secção de Fotografia e da Secção de Imagem em Movimento. Desde 2011, o Cineclube de Guimarães tem colaborado com a associação cultural Ó da Casa na organização das duas edições anuais do Guimarães Noc Noc e da primeira edição do Guimarães Yé-Yé. Nesse âmbito, foram realizados dois concertos no terraço da sede, inúmeras exposições de fotografia e videoarte e diversas instalações sonoras e visuais.

O ano de 2012, da Capital Europeia da Cultura (CEC), foi um ano especial na cidade de Guimarães e na actividade do nosso Cineclube. Mas para o Cineclube, o trabalho começou mais cedo: 2010 foi marcado pela colaboração na preparação e programação na área do Cinema da CEC e, em parceria com a Área da Comunidade da CEC, foram programados uma série de filmes no intuito de envolver a comunidade. Já em 2012, surgiriam outras actividades, como “O Cinema vai à Vila”, importante projecto de itinerância do cinema pelas vilas do concelho de Guimarães. Também com o apoio da CEC2012, o Cineclube de Guimarães produziu o documentário “Guimarães, 50 anos de Pop/Rock”, com realização de Ricardo Leite, membro da Secção de Imagem em Movimento. Juntamente com neste projecto, foi editado um livro e realizado um duplo concerto com as bandas mais emblemáticas da cena musical vimaranense das últimas décadas.

Apoiado pela área de programação de Música, o Cineclube de Guimarães concebeu e promoveu o projecto “O Cinema em Concerto”, uma série de 8 concertos com célebres músicas de bandas sonoras de cinema e projecção de imagens interpretadas pela Banda Musical de Pevidém e pela Orquestra Juvenil de Pevidém, que decorreram no Grande Auditório do Centro Cultural Vila Flor, no Cinema São Mamede, no Paço dos Duques de Bragança, no Centro Paroquial de Pevidém, no Centro Pastoral das Taipas e no Largo da Oliveira.

Ainda no âmbito da programação oficial da Guimarães 2012 – Capital Europeia da Cultura, o Cineclube de Guimarães é um dos promotores – em conjunto com a Sociedade Martins Sarmento, Convívio, Círculo de Arte e Recreio, Escola Secundária Joaquim Santos Simões e Escola Secundária Francisco de Holanda – do “Tributo a Santos Simões”, projecto que pretende homenagear uma figura impar na história cultural vimaranense da segunda metade do séc. XX. 

De acordo com os dados oficiais do Instituto de Cinema e Audiovisual (ICA), com uma média de 6 mil espectadores/ano entre 2007 e 2010 e de 8 mil espectadores/ano entre 2016 e 2020, o Cineclube de Guimarães tem sido o cineclube português com maior número de espectadores nas suas sessõesO Cineclube de Guimarães nunca teve complexos de ter um grande universo de associados. Por isso, desde o início percebeu que um expressivo número de sócios era garantia de um público diverso onde encontraria os mais diferentes gostos cinematográficos para as várias propostas de programação. Aliás, cumprir os objectivos de divulgação da cultura cinematográfica atingindo um maior número possível de pessoas sempre foi um propósito, sem quaisquer cedências ao nível da qualidade da programação. A justeza da estratégia constata-se pelo crescimento constante da associação, o que leva à criação de recursos financeiros que permitem o aumento de iniciativas e de filmes exibidos. Nos primeiros 20 anos o Cineclube realizou um pouco mais de 500 sessões; tendo projectado nos restantes 44 anos – que completou em Maio de 2022 – cerca de 2750 sessões. Estes números, particularmente os primeiros, pecam por defeito, porque sabe-se que vários registos não foram feitos, nomeadamente as projecções em formato vídeo que não foram sendo contabilizadas. Em paralelo ao crescimento da actividade, também o número de associados tem vindo a aumentar ao longo do tempo de forma sustentada: dos 500 sócios em 1985 aos cerca de 1000 sócios no ano em que o Cineclube de Guimarães completou 60 anos de existência.